Estava eu a passar uma hora que tinha sem nada para fazer a visitar lojas quando o que eu queria mesmo era encontrar plantas (talvez levasse uma, adoro plantas), quando me apontam um ramo de flores artificiais.
Eram narcisos… E eu gosto muito de narcisos…
Lembro-me de lhes tocar, invulgarmente altos e com cores que, para os narcisos verdadeiros, não são naturais… Aquele ramo era, sem dúvida, uma paleta de cores em narcisos artificiais…
Lembro-me de ver as pessoas a passar e a tocar com as mãos os narcisos entre frases de exclamação sobre, no dizer deles, quão bonitos eram e como gostavam de os ter, mas o problema era o preço, bastante alto.
Ainda olhei demoradamente os narcisos artificiais, à procura de um sinal que, efectivamente, mostrasse como eram bonitos. Mas a beleza está nos olhos de quem a vê. E, não obstante eu não a ter encontrado nesses narcisos, a maioria das pessoas achava-os bonitos.
Também, aquando a minha saída, passei por uma loja que ostentava, nas traseiras, montes de vasos com plantas, ou secas, ou ainda a murchar e por um preço irrisório. Ninguém lhes pegava ou voltava sequer a cabeça. Voltei a pensar no quanto as pessoas achavam bonitas as flores artificiais.
Então, arranjei duas flores, uma artificial e colorida e uma seca. Passei a perguntar às pessoas qual achavam mais bonita. E, para grande desilusão minha, praticamente todas me respondiam: a artificial, porque é colorida e não murcha.
Concluí que, portanto, poucas pessoas sabem apreciar a verdadeira beleza; porque praticamente todas gostam do falso e artificial.
Posso dizer que, de ambas as flores, a flor murcha é mais bonita. Não pelas cores ou por não murchar porque, efectivamente, já o está. Mas por um simples facto: é verdadeira. E, se é verdadeira, existe e chama-se flor. Porque todas as verdadeiras flores murcham. A artificial não é uma flor porque, efectivamente, não murcha. Além do mais, nem tem cheiro. As flores, mesmo murchas, podem continuar a agradar-nos com o seu doce perfume.
Para mim, a verdadeira beleza está na fealdade. Sei que parece uma contradição, mas aquilo a que chamamos perfeição tende a ser aborrecido. Além do mais, não existem coisas perfeitas porque, para algo ser perfeito, tinha de agradar a todos e não existe nada que agrade a todos uniformemente. Porque a noção de perfeição varia de pessoa para pessoa.
Uma flor artificial pode não murchar e enfeitar uma jarra. Mas uma flor verdadeira, mesmo murcha, ainda que não seja atraente, perfuma o ar e torna-o agradável.
Muitas vezes vejo gente que oferece rosas sem espinhos. Para as pessoas, o mau das rosas são mesmo os espinhos, se bem que eu acho que é isso que as torna bonitas. São os espinhos que as tornam diferentes das outras flores. Por exemplo, na aldeia dos meus bisavós a minha mãe tem um pomar cheio de árvores de fruto. Nomeadamente laranjeiras. No entanto, houve uma laranjeira que, mal foi plantada, morreu. Mas, antes de morrer, tinha dado um outro rebento no mesmo local. Esse rebento tornou-se uma laranjeira. No entanto, eu nunca tinha visto, essa laranjeira tem espinhos no tronco. Eu, pessoalmente, nunca tinha visto uma laranjeira com espinhos no tronco. E é a minha laranjeira preferida, por causa dos espinhos. Porque, de entre todas as laranjeiras existentes no pomar, aquela é única.
Tenho vários vasos com plantas na varanda. Quando fui de férias de Verão, não tive quem mos regasse e elas ficaram expostas ao calor abrasador. Hoje, estão completamente secas, algumas sem folhas e escuras. A minha mãe teima em dizer que estão mortas. Mas eu continuo a regá-las como rego as poucas que continuaram verdes, porque são tão “plantas”, por assim dizer, como as outras e, além do mais, são essas mesmas plantas secas e murchas que precisam da maior parte da atenção e não as plantas verdes e com flores; precisam que as tratemos com mais cuidado e que invistamos mais nelas, porque estão secas e precisam ser tratadas. Qual não é o espanto da minha mãe quando, uma manhã, uma daquelas plantas que, durante um ano, foi regada completamente murcha, ostentava duas folhas pequenas mas muito verdes no meio das outras escuras!...
Este exemplo das flores pode aplicar-se para tudo na vida e o mesmo se passa com os seres humanos.
As pessoas são plantas, umas verdes, porque foram tratadas com carinho e atenção, outras murchas porque, ou não tiveram tanta protecção como as verdes, ou estiveram expostas a momentos da vida que, pela sua dureza, as fizeram secar. Há que prestar mais atenção às pessoas murchas porque, com alguma persistência, podem dar folhas novas.
Também tal como as plantas, que podem ser de espécies diferentes, também as pessoas são diferentes; cada pessoa tem uma maneira muito especial de ser tratada. Há que descobri-la, a fim de não a deixarmos murchar.
Ainda de encontro ao início do assunto, creio que são aqueles pormenores a que normalmente chamamos imperfeições que tornam bonita uma pessoa, porque a beleza, efectivamente, pode ser maçadora, demasiado monótona, demasiado equilibrada, demasiado limpa, demasiado… perfeita. E o que é em demasia, cansa.
Vou dar como exemplo as marcas do rosto. Se, para a maioria, as rugas de expressão deveriam ser erradicadas, para mim, são elas que tornam os rostos facilmente identificáveis. Cada pessoa tem linhas muito próprias quando sorri, chora ou franze o sobrolho. Elas, também, tornam o rosto dinâmico. Um rosto sem linhas de expressão ou qualquer dobra seria monótono, demasiado liso, sem qualquer mostra de sentimento. Por isso digo que demasiada perfeição pode ser equivalente a fealdade.
Mas que é que isso interessa?
Também no mercado da vida muita gente escolhe pessoas artificiais muito coloridas, que, por assim dizer, “não murcham”, ou pelo menos parece que não.
Mas, quando é que uma pessoa é uma flor bonita?
A educação é o melhor caule que uma pessoa pode ter para alcançar outros valores.
A alegria é a melhor folha para um bom caule.
A bondade torna as folhas mais verdes.
A humildade dá recortes exuberantes às folhas.
A simplicidade dá as cores vivas.
A delicadeza é mesmo a característica principal de uma flor.
A gentileza é o melhor perfume que uma flor pode dar.
Porque as pessoas, tal como as flores, valem pelo que emanam e pelo que são e não pelo que aparentam ser ou idealizamos que sejam. Porque devemos avaliar as pessoas pelo que elas dão e não pelo que gostávamos que dessem ou tivessem dado.
Nunca escondas dos outros a tua verdadeira essência, por mais disparatada que a julgues.
PORQUE TU VALES PELO QUE ÉS E NÃO POR AQUILO QUE APARENTAS SER!