domingo, 28 de setembro de 2008

Subtracção


Trezentos e quarenta e três mil
Seiscentos e vinte e um
São os dias de vida da flor cor-de-rosa.
--
Trezentos e quarenta e três mil
Seiscentos e vinte e um
Tiraram-se uns três mil:
Trezentos e quarenta mil
Seiscentos e vinte e um
E não deixa de ser tempo a mais
Para uma flor cor-de-rosa.
--
Trezentos e quarenta mil
Seiscentos e vinte e um
Tiraram-se uns seiscentos:
Trezentos e quarenta mil
E vinte e um
E um número deu a mão à vogal.
--
Sim, “um” número
Porque além de numeral cardinal
Também tem função linguística
E indica quanto é
(mas quanto será mesmo um?).
--
Trezentos e quarenta mil
E vinte e um
Tiraram-se uns quarenta mil:
Trezentos mil
E vinte e um
Sóis viu nascer a flor cor-de-rosa
Quando se abria, irradiava a Lua
Quando fechava, o Sol voltava para a ver…
--
Trezentos mil
E vinte e um
Tiraram-se uns vinte e um:
Trezentas mil vezes
O colibri namorou a flor cor-de-rosa
Sem que esta se dignasse a voltar a corola.
Mas porquê o ar gélido
De uma flor que era o Sol?
--
Trezentos mil…
Se os tirarmos…
O que fica?...
--
Trezentos e quarenta e três mil
Seiscentos e vinte e um
São os dias de vida da flor cor-de-rosa
Sem que esta merecesse tempo algum.
Devagar ou depressa
A vida acontece.
--
Trezentos e quarenta e três mil
Seiscentos e vinte e um
Tiraram-se todos num repente
E porque a vida o consente
O resultado é: nenhum.
--
(Aviso os leitores deste blogue que só passarei por aqui espaçadamente como tenho feito há já duas semanas, pois o horário escolar mais não me possibilita. De qualquer das maneiras, também é verdade que o tempo de estudante vai ser a melhor época da minha vida, não? Sinto-o e ainda nem acabei o secundário...).

terça-feira, 23 de setembro de 2008

O Amor


Outrora as pessoas
reconheciam o valor
do amor,
sem o confundirem
com prazeres e ambições.
No presente as pessoas
Quase não reconhecem
o valor
que é o amor
que é como
uma flor
delicada,
como uma fada,
que tira as penas do coração
recordando o que é
o amor
e dele vem a palavra "amar",
"sonhar", "descobrir".
Mas o mundo...
Mas as pessoas...
No futuro ninguém
vai conhecer o amor
e só vai haver a dor,
o prazer, a ambição,
penas de coração
e nenhuma flor
que é o amor
delicada como uma fada
que tira as penas do coração.
Só vai reinar a guerra
que mata pessoas...
Mas ninguém tem maior
amor,
do que aquele que nos criou,
que sempre perdoou,
que criou todas as criaturas da Terra.
Vive num reino
difícil de imaginar
onde o amor é
sonhar
e perdoar
e amar.
No futuro
pode, na Terra, não haver uma flor
delicada,
como uma fada,
que tira as penas do coração.
Mas nesse reino há
e sempre haverá
uma flor,
não é igual às outras,
não esquece o amor,
viveu as virtudes da vida
no passado, em que
outrora as pessoas
reconheciam o amor,
sem o confundirem
com prazeres e ambições.
Essa flor
é passado, presente e futuro
nunca murchará
nem morrerá,
ninguém a esquecerá,
somente no futuro,
em que não haverá amor,
se as pessoas assim continuarem.
Precisamos não esquecer o amor
que é uma flor,
o perdão.
Essa flor vou dizer agora
o seu nome.
Tu também já a conheces.
É uma flor
onde reina a alegria
chamada Virgem Maria.
Tem um filho
o Filho de Deus,
que deu a vida por nós
morrendo na cruz
cujo nome é Jesus.
Mas as pessoas esquecem
o que é o amor,
não sabem perdoar,
respeitar,
amar...
Amor têm verdadeiramente
os nossos pais
ensinam-nos a respeitar,
perdoar
e amar
e o professor
que nos ensina
a perdoar,
a respeitar
e a amar.
O amor é assim mesmo,
dar a vida pelos outros,
amar as pessoas
que precisam de carinho.
Mas a ambição
é numa pena de coração.
Muito pior é a maldade
tenta as pessoas
ao roubo,
ao escárnio.
O amor
tem uma cor,
que é o vermelho.
É a cor do coração
que é união
e perdão.
Peço-vos um favor:
se sabeis o que é o amor
amai,
perdoai,
respeitai
sempre,
é o que Deus quer
e toda a gente.
Se quereis entrar nesse reino,
fazei o que vos disse,
pois um dia Jesus,
que morreu por nós na cruz,
esclareceu:
"Amai-vos uns aos outros como eu vos amei."
Se o fizerdes
sem preguiça,
sem cobiça,
ireis para esse reino.
E sereis felizes sempre... sempre... sempre...

domingo, 21 de setembro de 2008

...


p

um jogo

pa

balbúcios

pal

um começo

pala

uma identidade

palav

a formação do autêntico ser

palavr

a continuidade

palavra

a totalidade



(hoje a palavra cresceu no poema minimalista)

domingo, 14 de setembro de 2008

in memoriam


a tarde passava silencioza, cinzenta
ainda nem eu nome teria
e mesmo sem experiência de vida
fui eu que te baptizei
e dei-te um nome: 'vó
-
sim, 'vó e não avó
porque o número de letras não importa
e era de maior jeito um nome mais curto
visto que o chamava muitas vezes
-
guardo comigo na memória
as histórias que sempre pedia
mas porquê, 'vó, explica-me
por que eram sempre tão tristes?
-
a tarde passava silenciosa, cinzenta
e caminhando no jardim da minha vida
entristeço-me
-
mas o tempo não pára
árvores já ganharam e perderam folhas
rios já encheram e vazaram
flores já nasceram e já murcharam
-
as estações sucedem-se
e, tal como já fui pequena um dia
agora estou grande, cresci
e se visses como estou enorme
-
tal como o número de letras
também o tamanho não importa
porque ainda continuo a ser a menina das trancinhas e dos folhos
que fielmente todas as noites
quando o sono custa a chegar
ainda pede como quem pede o mundo
(o meu)
"avó, conta-me uma história"
-
a tarde passava silenciosa, cinzenta
e caminhando no jardim da minha vida
entristeço-me
quando vejo que hoje um banco está vazio
-
(à minha avó, onde quer que ela esteja)

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

O avião

No início, era só um papel. Depois, começou a ganhar forma. E, nas mãos da criança, surgiu um avião.
Levou-o para dentro de casa e brincava com ele. Mas os pais ralharam, dizendo que se era para estragar alguma coisa, que fosse lá para fora.
A criança e o avião foram lá para fora. De vez em quando a criança tinha de apanhar o avião no meio da estrada. Uma senhora chamou-os à atenção dizendo que ali não era para brincar.
Foram para o jardim. A criança voltou a brincar com o avião. Mas este foi parar dentro de casa de um homem novo que lho devolveu, dizendo que tinha sido um desperdício de papel e que não incomodasse as pessoas. Até que uma senhora idosa se lembrou de dizer à criança que fosse para o espaço aberto à beira do regato.
E a criança foi. Recomeçou a brincadeira com o avião. Parecia que nada podia interromper aquele momento de alegria.
Mas, no último voo, o avião mudou de direcção e caiu nas águas do regato. A criança viu o papel mergulhar e desaparecer… E começou a chorar…
Uma jovem rapariga, que passeava com o cão, passou e, vendo uma criança a chorar, abeirou-se. E perguntou:
- Então… por que choras?
A criança, com voz trémula, respondeu:
- O meu avião… caiu na água… desapareceu…
- Vem cá.
E pegou na criança ao colo, enxugando-lhe as lágrimas. O cão sentou-se e, ao fim de um bocejo, deitou a cabeça no colo da criança.
- Não chores mais – pareciam dizer os olhos brilhantes do cão que, via-se, entristecera-se ao ver a criança a chorar.
A jovem rapariga passou-lhe a mão pela cabeça e perguntou de novo:
- Dizes tu que desapareceu?
- Sim… eu vi – respondeu a criança chorosa.
Ao que a jovem rapariga tornou:
- Pois fica a saber que eu estou a ver o teu avião lá ao fundo do regato!...
- Como é possível? – questionou a criança, erguendo a cabeça.
- O teu avião não desapareceu; antes, como já conheceu todo o céu, achou que tinha chegado a altura de conhecer todo o mar. E, para isso, transformou-se num barquinho…
Subitamente, a criança parou de chorar.
- Olha ele lá ao fundo – disse a jovem rapariga – está a despedir-se… Vai lá ver se o apanhas!...
Então, a criança levantou-se, mais o cão que a seguiu, desta vez com a língua de fora e a cauda a abanar de contente.
A criança aproximou-se do regato. No rosto, um sorriso de alegria. E, acenando com a mão para o horizonte que se perdia na direcção do Sol, disse bem alto:
- Adeus, adeus, faz boa viagem! Adeus, adeus, até ao mar!...

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Quadras ao gosto popular


Passei o dia e a noite
à procura do meu gato
nunca mais o encontrei:
escondeu-se no sapato.

Passeava no pomar
quando uma maçã caiu:
a culpa é daquele gato
que uma vez lá subiu.

Surpreendeu-se o gato,
deu um salto e fugiu;
toda a noite o procuraram
nunca mais ninguém o viu.

Fico triste pelo gato:
quando acaba de comer
estica as patas, sai pr'á rua
e nem de mim quer saber.

Quando o frio lá fora corta
e está acesa a lareira
o gato estica e adormece
no soalho de madeira...

Estou danada com o gato
procuro-o pr'a lhe bater:
de tarde partiu a jarra
e fugiu-me a correr.

Gato é Hermes alado
sempre que lhe apetece:
num dia nunca me larga
noutro nunca me aparece!

Guardei o vestido novo
que comprei além na feira:
este não me rasga o gato
nem que esse danado queira!

No sofá fazia malha
quando me cai um novelo
o gato brincou com ele:
o gosto que me deu vê-lo!

Gato pequeno que brincas
sozinho co'as pedras da rua
trata de me deixar passar
que ela não é toda tua!

Aos meus gatos Mimica, Beethoven e Maria Anna e todos aqueles que já partilharam (uns mais, outros menos) algum tempo comigo: Wagner, Mozart, Teresa, Anna Magdalena, Schubert (Garfield, de identidade actual), Schumann e Giulianna. Ainda que não sejam gatos, quero acrescentar o meu cão Nicolau, as rolas Rute, Joana e Zé Manel, a aranha Pernalta e os canários Bach e Vivaldi (eram muito musicais). Ainda que alguns já não me pertençam e outros já tenham morrido, todos fizeram de igual modo parte da minha família. E, quer estejam agora comigo, ou com outras pessoas, ou mesmo no Céu, ainda continuam presentes e ainda tenho reservado a cada um deles um pedacinho de mim... Porque, ao contrário da maior parte das coisas grandes que encontramos na vida, o coração (que é pequeno) é das que nunca se gastam...
A todos eles o meu sincero agradecimento...

Gólgota


Soprava trémulo e mortal o vento
No dia que te roubou, secreto, a vida
Que, no final, já estava dorida
Pelo tempo que passara tal tormento...


Com a alma de passado turbulento
E, no fim, vendo a Morte apercebida
Ainda miraste com expressão ferida
A gélida face do Sofrimento...


(Sai a alma de um corpo mutilado
Estanca o sangue o coração parado
Cansado de bater pelo seu fadário)


Perdoa-me! por fraco me ter tornado
Por no fim não te ter acompanhado
Até ao duro suplício do Calvário!...

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

O menino que gostava de escrever

Era uma vez um menino que gostava muito de escrever. Nas suas histórias, todas as suas personagens tinham sempre finais muito bonitos e as palavras que usava para contar uma história tornavam-na encantadora, por mais simples que fosse.
Todos admiravam muito o menino que gostava de escrever.

Um dia, a professora encarregou os alunos de escrever uma redacção sobre um tema actual e realista. Imediatamente, todos os olhos pousaram sobre o menino, interrogando-se sobre o que iria sair daquela cabecinha tão pequena.
Ao chegar a casa, o menino começou a trabalhar na redacção.
- Uma composição sobre um tema actual e realista?
Depois de muito pensar, pegou numa folha de papel lisa e começou a escrever.

Era a história de um velhinho que morava numa cabana no meio da neve, num planeta que ainda ninguém havia descoberto e que tinha como única companhia os seus chinelos falantes.

No dia seguinte, as composições foram entregues à professora que, na tarde do mesmo dia, as entregou corrigidas.
Havia temas de todo o género: desde histórias com crianças paralíticas, ou que eram órfãs ou que viviam com pessoas que as tratavam muito mal. As notas foram bastante altas. Mas toda a turma se espantou quando devolveram ao menino a sua composição com um “Suficiente” escrito em letras vermelhas e grossas.
Os colegas, claro, não perceberam! Tinha sido a nota mais baixa! A professora, então, chamou-o à frente da sala:
- Gabriel, chega cá à frente…
O menino foi à frente do quadro, a medo. Os olhos dos colegas estavam, como sempre, postos em cima dele. A professora tornou:
- Lembras-te, com certeza, dos critérios pedidos para a elaboração da tua composição, não te lembras?
- Sim, senhora professora.
- Quais eram eles?
- A história deveria ser actual e bem realista.
- Ora acontece que a tua história não é actual, nem tão pouco realista.
Os colegas olharam para o menino com interesse.
- Gabriel, diz-me uma coisa, desde quando é que os chinelos falam?
A turma rompeu em gargalhadas. O menino respondeu:
- Falam na minha imaginação.
- Imaginação e realidade não são a mesma coisa…
- Isso é uma grande mentira! Antes de algo existir é preciso que seja imaginado!
A professora, que não gostou que a contrariassem, disse então:
- Não tenho muito a certeza de que um dia venham a existir chinelos falantes…
Os colegas riram de novo. O menino baixou a cabeça.
- E diz-me uma coisa: não me parece muito actual, muito menos real, um velhinho a viver numa cabana no meio da neve num planeta que ainda não foi descoberto. Isso parece-te verdade?
Mais gargalhadas abanaram a sala. O menino estava quase a chorar, mais ainda disse:
- Mas quantos velhinhos não vivem nas suas casas no meio da neve tendo como única companhia os seus chinelos?
O olhar da professora ficou subitamente carregado de cólera, como se o menino tivesse descoberto algo que lhe dizia respeito. E mandou-o sentar, com um recado para os pais por indisciplina. “Ousou responder a um superior” lia-se em letras bem visíveis, igualmente vermelhas.

Durante a noite o menino chorou. Mas seria mentira o facto de os chinelos não falarem?
Mas o certo é que, vendo-o tão abatido, os seus chinelos começaram a cochichar, perturbados. O menino ainda levantou a cabeça mas, lembrando-se da aula e do sermão da professora, murmurou:
- Os chinelos não falam…
Deitou a cabeça na almofada e adormeceu.

domingo, 7 de setembro de 2008

Um Perseu romanceado


Ecoava no bosque uma ave cantante
Quando fugia da cruel Medusa
Que não aceitava a minha recusa
Em me tornar seu eterno amante!

Reflectia o Sol o escudo brilhante
numa linha luminosa e difusa
E como por dentro o mal não se acusa
O silvo da espada ecoa vibrante.


(Corta-se a cabeça; a besta está morta
Olhava, absorto, a lâmina que corta
E um rosto por maldade deformado)


Que me fizeste, que mal, que magia
Se só de te olhar, oh Górgone fria
Meu coração em pedra foi tornado?

sábado, 6 de setembro de 2008

La maison des mots


Dans cette maison où tout est possible
les mots sont aussi livres,
et grandent, et vivent et meurent
comme le Soleil et faisent-il, jaune,
se torner un peu de rouge...


Dans cette maison où tout est possible
j'habite aussi livre comme les mots
je vole avec mes paroles
achetêr un peu de papier
pour écrire avec les mots que meurent...


(La tristesse habite le plus profonde de mon coeur
Je ferme mes yeux et vois tout noire...)


Dans cette maison où tout est possible
mon coeur ne me laisse pas avoir de rêves...

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