Confesso: estava sem qualquer assunto para uma crítica. Apesar de ser quarta-feira, serem 22:36 da noite e de eu saber que esta redacção deveria estar pronta a tempo (ou seja, até HOJE, que não tenho o tempo todo), nem mesmo a pressão me ajudava a raciocinar mais depressa. Porque no meu caso a necessidade não costuma aguçar o meu engenho, antes ainda mo entorpece mais… para fazer uma coisa bem feita, dispenso a pressão: antes, preciso tempo. E tempo era o que eu não tinha.
Sem qualquer assunto para escrever, decidi dar uma olhada no Jornal de Notícias que leio, não pontualmente nem fielmente, mas religiosamente todos os dias.
As notícias? As do costume. Desgraças, como sempre, com as coisas mais alegres e culturais no final… também, se estivessem no início, eram muitas páginas que grande parte das pessoas tinha de saltar. É, portanto, uma maneira simpática de tornar o jornal um pouco mais funcional. A ideia que eu tenho de um jornal é que este é um pouco género supermercado: os produtos que têm menos interesse mas que chamam mais gente estão à porta e temos de atravessar toda uma loja de facultativos até chegar ao que realmente necessitamos.
Mas não estou aqui para criticar a estrutura de um jornal, muito menos a de um supermercado. Acontece que, no rodapé de cerca de cinco notícias sobre Maputo, Moçambique e província de Gaza, encontrava-se uma pequena nota que dizia:
ASSINALA-SE, HOJE, O DIA INTERNACIONAL DO IDOSO
Sabia que era o Dia Mundial da Música, mas daí a ser o Dia Internacional do Idoso, isso foi novidade para mim.
Dia Internacional do Idoso… isso sim, fez-me pensar. E, como Geografia não é apenas “lê, estuda, avalia e deita fora que não precisas disso para nada”, lembrei-me de uma matéria que dei não há muito tempo, em finais do 10.º ano, que era sobre a condição das camadas idosas em Portugal. Comecei a pensar… e, consequentemente, a crítica começou a surgir.
Li também outros documentos; segundo o Ministério da Segurança Social e do Trabalho, numa compilação intitulada de “100 compromissos para uma política da família”, foquei a minha atenção no compromisso 33:
“Combater a exclusão e a solidão dos mais idosos, incentivando e apoiando as famílias que privilegiem a manutenção dos idosos em casa.”
Será que os idosos sabem que hoje é o seu dia? Provavelmente não. Quando é o Dia da criança, há quem lhes ofereça prendas, porque elas pedem. E no dia do idoso? Se eles soubessem? Na certa em imensos idosos a petição seria sempre a mesma, sobretudo nos viúvos: “Leva-me para casa”.
Longe vão os tempos em que os idosos eram vistos como um livro de conhecimentos. Ainda que tenhamos muito de medieval, da antiguidade clássica ainda, a importância dos idosos na sociedade, essa, tem vindo a diminuir. Vistos muitas vezes como um fardo, conheço casos de idosos que foram postos em lares e que nunca receberam uma visita dos familiares, pois há quem tenha a coragem de dar à instituição nomes, moradas e números falsos, nunca podendo ser contactados. Se antes os órfãos eram crianças, cada vez mais são os pais, agora idosos, tornados órfãos…
As reformas, essas, são em alguns casos caracterizadas por extrema desigualdade: dependendo do papel que ocuparam na sociedade em vida activa ou outros aspectos, há idosos que recebem autênticas fortunas, tão boas ou melhores que um ordenado, enquanto que outros sobrevivem com reformas inferiores a um ordenado mínimo.
Hoje, Dia Internacional do Idoso, como foi? Eu não sei, não tenho contacto com idosos, visto que não tenho avós maternos. Mas como terá sido? As pessoas terão sabido? E se souberam? Talvez sim, hoje, aquela senhora tenha recebido a tão esperada visita dos netos e os tenha presenteado com abraços, doces e umas histórias. Mas amanhã, será igual?
Digo isto porque, infelizmente, cada vez mais o ser humano precisa de datas-memória, ou seja, de um dia no ano para se lembrar do que é importante (aqui está a teoria do supermercado: o desnecessário sempre na frente). Mas será preciso haver um Dia Mundial do Não-Fumador para as pessoas se lembrarem dos malefícios do tabaco? Já não o ouviram o suficiente? E será preciso haver um Dia Mundial da Criança para, em todo o mundo, as pessoas e instituições se tornarem subitamente generosas e darem, por exemplo, donativos avultados a campanhas especiais para esse dia? E os outros dias? Por acaso será uma campanha mais generosa num dia por ano que melhorará as condições das crianças com dificuldades em todo o mundo? Do mesmo modo: será mesmo preciso um dia de S. Valentim para, de repente, todos os casais se darem subitamente muito bem e terem tempo para aquele jantar adiado há meses?
Em relação ao Natal, a situação não se difere: decerto, em muitas famílias, as pessoas só se encontram reunidas no Natal. E o Ano Novo também tem que se lhe diga: será mesmo necessário um início de ano para fazer as pessoas pensar do que querem da vida e fazer resoluções que, na maior parte das vezes, não cumprem? É pena, também, que seja preciso um Dia do Livro para, por um dia, se incrementar hábitos de leitura nos portugueses.
Não, não sou contra esta maneira de datação. Pegando no exemplo do Dia do Livro, ainda que faça as pessoas ler, nem que seja por um dia, sempre é melhor que dia nenhum. Quando ao Dia Mundial da Criança, sempre é melhor donativos avultados e campanhas especiais por um dia do que nenhumas e não ajudar nada. Só acho que esses dias não deveriam assinalar coisas grande parte do tempo esquecidas pela população. É o meu ponto de vista.
Num mundo desenvolvido cada vez mais industrializado e o que conta é, não a eficiência, mas a velocidade, não a imaginação, mas a racionalidade, com cada vez mais luxos e menos tempo para os gozar, as pessoas deixaram de ter tempo para si. Num mundo em que as principais prioridades são produzir e inovar, as pessoas deixaram de poder construir e criar. Não exercemos o nosso trabalho, o trabalho é que, no fundo, nos parece exercer a nós. O futuro é a prioridade: preparamos um futuro e vivemos pouco o presente; e esquecemos que esse futuro que preparamos cuidadosamente um dia vai ser presente e, à semelhança de outros “presentes”, vai ser mal vivido. Se assim foi, de que valeu prepará-lo?
Não digo que não pensemos no futuro, mas em conta, peso e medida. Porque é no presente que tudo acontece, não é no futuro. Num mundo cada vez mais dominado pela robótica, vamo-nos tornando também robôs. Daí a invenção destas datas-memória: lembrar, nem que seja por vinte e quatro horas, de que as únicas prioridades não são o produzir e inovar, mas também nos preocuparmos connosco. Preocuparmo-nos connosco não é egoísmo, antes uma maneira solidária de darmos mais aos outros. Como poderemos dar alegria se não formos alegres? Como podemos dar apoio se não formos apoiados? Cada um dá aquilo que tem. É que, às vezes, mais vale um dia bem vivido que uma vida inteira sem interesse.
Sem qualquer assunto para escrever, decidi dar uma olhada no Jornal de Notícias que leio, não pontualmente nem fielmente, mas religiosamente todos os dias.
As notícias? As do costume. Desgraças, como sempre, com as coisas mais alegres e culturais no final… também, se estivessem no início, eram muitas páginas que grande parte das pessoas tinha de saltar. É, portanto, uma maneira simpática de tornar o jornal um pouco mais funcional. A ideia que eu tenho de um jornal é que este é um pouco género supermercado: os produtos que têm menos interesse mas que chamam mais gente estão à porta e temos de atravessar toda uma loja de facultativos até chegar ao que realmente necessitamos.
Mas não estou aqui para criticar a estrutura de um jornal, muito menos a de um supermercado. Acontece que, no rodapé de cerca de cinco notícias sobre Maputo, Moçambique e província de Gaza, encontrava-se uma pequena nota que dizia:
ASSINALA-SE, HOJE, O DIA INTERNACIONAL DO IDOSO
Sabia que era o Dia Mundial da Música, mas daí a ser o Dia Internacional do Idoso, isso foi novidade para mim.
Dia Internacional do Idoso… isso sim, fez-me pensar. E, como Geografia não é apenas “lê, estuda, avalia e deita fora que não precisas disso para nada”, lembrei-me de uma matéria que dei não há muito tempo, em finais do 10.º ano, que era sobre a condição das camadas idosas em Portugal. Comecei a pensar… e, consequentemente, a crítica começou a surgir.
Li também outros documentos; segundo o Ministério da Segurança Social e do Trabalho, numa compilação intitulada de “100 compromissos para uma política da família”, foquei a minha atenção no compromisso 33:
“Combater a exclusão e a solidão dos mais idosos, incentivando e apoiando as famílias que privilegiem a manutenção dos idosos em casa.”
Será que os idosos sabem que hoje é o seu dia? Provavelmente não. Quando é o Dia da criança, há quem lhes ofereça prendas, porque elas pedem. E no dia do idoso? Se eles soubessem? Na certa em imensos idosos a petição seria sempre a mesma, sobretudo nos viúvos: “Leva-me para casa”.
Longe vão os tempos em que os idosos eram vistos como um livro de conhecimentos. Ainda que tenhamos muito de medieval, da antiguidade clássica ainda, a importância dos idosos na sociedade, essa, tem vindo a diminuir. Vistos muitas vezes como um fardo, conheço casos de idosos que foram postos em lares e que nunca receberam uma visita dos familiares, pois há quem tenha a coragem de dar à instituição nomes, moradas e números falsos, nunca podendo ser contactados. Se antes os órfãos eram crianças, cada vez mais são os pais, agora idosos, tornados órfãos…
As reformas, essas, são em alguns casos caracterizadas por extrema desigualdade: dependendo do papel que ocuparam na sociedade em vida activa ou outros aspectos, há idosos que recebem autênticas fortunas, tão boas ou melhores que um ordenado, enquanto que outros sobrevivem com reformas inferiores a um ordenado mínimo.
Hoje, Dia Internacional do Idoso, como foi? Eu não sei, não tenho contacto com idosos, visto que não tenho avós maternos. Mas como terá sido? As pessoas terão sabido? E se souberam? Talvez sim, hoje, aquela senhora tenha recebido a tão esperada visita dos netos e os tenha presenteado com abraços, doces e umas histórias. Mas amanhã, será igual?
Digo isto porque, infelizmente, cada vez mais o ser humano precisa de datas-memória, ou seja, de um dia no ano para se lembrar do que é importante (aqui está a teoria do supermercado: o desnecessário sempre na frente). Mas será preciso haver um Dia Mundial do Não-Fumador para as pessoas se lembrarem dos malefícios do tabaco? Já não o ouviram o suficiente? E será preciso haver um Dia Mundial da Criança para, em todo o mundo, as pessoas e instituições se tornarem subitamente generosas e darem, por exemplo, donativos avultados a campanhas especiais para esse dia? E os outros dias? Por acaso será uma campanha mais generosa num dia por ano que melhorará as condições das crianças com dificuldades em todo o mundo? Do mesmo modo: será mesmo preciso um dia de S. Valentim para, de repente, todos os casais se darem subitamente muito bem e terem tempo para aquele jantar adiado há meses?
Em relação ao Natal, a situação não se difere: decerto, em muitas famílias, as pessoas só se encontram reunidas no Natal. E o Ano Novo também tem que se lhe diga: será mesmo necessário um início de ano para fazer as pessoas pensar do que querem da vida e fazer resoluções que, na maior parte das vezes, não cumprem? É pena, também, que seja preciso um Dia do Livro para, por um dia, se incrementar hábitos de leitura nos portugueses.
Não, não sou contra esta maneira de datação. Pegando no exemplo do Dia do Livro, ainda que faça as pessoas ler, nem que seja por um dia, sempre é melhor que dia nenhum. Quando ao Dia Mundial da Criança, sempre é melhor donativos avultados e campanhas especiais por um dia do que nenhumas e não ajudar nada. Só acho que esses dias não deveriam assinalar coisas grande parte do tempo esquecidas pela população. É o meu ponto de vista.
Num mundo desenvolvido cada vez mais industrializado e o que conta é, não a eficiência, mas a velocidade, não a imaginação, mas a racionalidade, com cada vez mais luxos e menos tempo para os gozar, as pessoas deixaram de ter tempo para si. Num mundo em que as principais prioridades são produzir e inovar, as pessoas deixaram de poder construir e criar. Não exercemos o nosso trabalho, o trabalho é que, no fundo, nos parece exercer a nós. O futuro é a prioridade: preparamos um futuro e vivemos pouco o presente; e esquecemos que esse futuro que preparamos cuidadosamente um dia vai ser presente e, à semelhança de outros “presentes”, vai ser mal vivido. Se assim foi, de que valeu prepará-lo?
Não digo que não pensemos no futuro, mas em conta, peso e medida. Porque é no presente que tudo acontece, não é no futuro. Num mundo cada vez mais dominado pela robótica, vamo-nos tornando também robôs. Daí a invenção destas datas-memória: lembrar, nem que seja por vinte e quatro horas, de que as únicas prioridades não são o produzir e inovar, mas também nos preocuparmos connosco. Preocuparmo-nos connosco não é egoísmo, antes uma maneira solidária de darmos mais aos outros. Como poderemos dar alegria se não formos alegres? Como podemos dar apoio se não formos apoiados? Cada um dá aquilo que tem. É que, às vezes, mais vale um dia bem vivido que uma vida inteira sem interesse.
Dia sem imaginação Comecei a pensar e a crítica começou a surgir. Crítica: apreciação, ou censura. Fechei o jornal e a crítica está feita.
2 comentários:
*
dignidade para os idosos,
é urgente . . . urgentissimo,
mas ... como ?
se os próprios familiares,
os põem, em autenticos
depósitos humanos,e voltam uma
unica vez em cada mês, apenas
para liquidarem a mensalidade...
,
penosas conchinhas, deixo,
,
*
penso que é muito maldoso e egoista para os idosos serem postos em lares. Porque vê uma coisa: que direito tem uuma filha por a sua mãe no asilo? o que sente a propria velhota? Com certeza irá sentir-se atraiçoada,e, acabara porrrer de desgosto. Não gosto que as pessoas façam isso umas umas às outras. No entanto, está na mente no ser humano ( desculpa, mas eu tenho uma espécie de `paranioa`pelo cerebero humano, tal como pelo corpo) ir pelos caminhos mais faceis. E a facilidade, por vezes,é dura e cruel.
Fria como a a noite.
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